O contexto da Educação Musical enquanto veículo para a transmissão de valores – o caso particular do Espaço Vida e Música Portugal

  • Rebeca Roxo Couto

Resumo

Parece haver um consenso quase intuitivo de que a música é universal e comunicativa. E, no entanto, o meio do ensino musical no Ocidente hoje está permeado de niilismo, individualismo, e obsessão pela técnica. Pesquisa revista sugere que a música é simultaneamente um reflexo de e uma ferramenta para a afirmação e preservação dos valores e identidade de um grupo ou cultura. De que modo projetos de educação musical podem tirar melhor partido da possibilidade que a música apresenta de ser usada para comunicar, fomentar, e afirmar valores numa comunidade? Para responder a esta questão, foi adotada uma abordagem construtivista, e observou-se um caso em particular: o Espaço Vida e Música Portugal (EVM). Aproveitando a lista de valores formulada para a Rokeach Value Survey, procedeu-se à observação (participante e não-participante) e à realização de entrevistas, visando compreender a perceção dos envolvidos sobre a transmissão de valores no EVM. Em conclusão, foi possível perceber que é através de um conjunto de estratégias musicais e extramusicais que o EVM prioriza e fomenta o envolvimento musical e interpessoal, e que os participantes entendem ser através desse envolvimento que determinados valores são, de facto, transmitidos e promovidos com sucesso. Assim, elabora-se uma análise crítica sobre a relevância das observações e conclusões geradas, e considera-se a importância do caso do EVM para um processo de “ressignificação” do ensino da música, rumo a uma perspetiva mais envolvente e consciente do potencial sociocultural da música em si.

Palavras-chave: Ensino de Música, Educação Musical, comunicação, comunidade, transmissão de valores, desenvolvimento pessoal, desenvolvimento supraindividual, cultura, Espaço Vida e Música. 

 

Abstract

There seems to be a general, almost intuitive consensus that music is universal and communicative. And yet, the environment of music teaching in the West today is permeated by nihilism, individualism, and obsession with technique. Reviewed research suggests that music is simultaneously a reflection of and a tool for the affirmation and preservation of a group or culture’s values and identity. In what way can music education projects take better advantage of the possibility music presents to be used to communicate, nurture, and affirm values in a community? To answer this question, a constructivist approach was adopted, and a particular case was observed: Espaço Vida e Música Portugal (EVM). Utilizing the list of values conceived for the Rokeach Value Survey, the investigation proceeded through observation (participating and non-participating) and carrying out of interviews, aiming to understand the involved individuals’ perception concerning the transmission of values at EVM. In conclusion, it was possible to understand that it is through a set of both musical and extramusical strategies that EVM prioritizes and fosters musical and interpersonal engagement, and that participants understand it is through that engagement that certain values are, in fact, successfully transmitted and promoted. A critical analysis is elaborated on the relevance of the generated observations and conclusions, and considerations are made on the importance of EVM’s case to the process of “resignification” of music teaching, towards a perspective that’s more engaging and conscious of music’s sociocultural potential.

Keywords: Music teaching, Music Education, communication, community, transmission of values, personal development, supraindividual development, culture, Espaço Vida e Música.


 

Prefácio

A Música. Esta entidade superior, valiosa, quase tão abstrata quanto concreta; esta arte unificadora, complexa e comovente, que tem por matérias-primas o mero som, o tempo, e a matemática. Nós, que lidamos com ela; nós, que aprendemos a tocar um instrumento e a produzimos; nós podemos testemunhar do quanto a aprendizagem da música nos impacta, nos forma, nos molda – o quanto ela nos beneficia, e nos faz quem nós somos. Temos ouvido falar sobre a música enquanto “linguagem universal” – é uma arte que une, que cria pontes, que gera comunidade. E, no entanto, quantos de nós já não se sentiram frustrados, desiludidos, desvalorizados no contexto do ensino musical? Quantos não vimos desistir das aulas, e até largar o instrumento como se a música não passasse de uma carreira, que uns conseguem e outros não? Quantas vezes os padrões e paradigmas do ensino não serviram mais para nos fazer sentir excluídos do que integrados?
A música está por todo o mundo, e o seu ensino também. Em alguns lugares, especialmente no Ocidente, o modo como a sociedade progrediu deixou pouco espaço para a vida em comunidade, e uma longa lista de atividades foi afetada por fatores prejudiciais como o individualismo, o niilismo, a ultra-especialização. Caminhamos todos como produtos de uma fábrica, num trajeto em que tudo é uma competição para que vença o mais apto. O mundo da arte tornou-se elitista e implacável. Afinal, não era a música uma “linguagem universal”? Será que isso algum dia foi verdade? Se não o é, porque é que temos contacto com tantos contextos em que o parece ser? E se o é, porque é que em alguns meios as pessoas se comportam como se a música fosse só para alguns?
Enquanto professores de música, o que está ao nosso alcance fazer para entender melhor o que a música significa para a humanidade e o que ela é capaz de produzir, muito além de profissionais talentosos ou carreiras de virtuosismo? O que podemos fazer para melhor aproveitar tudo o que a música nos pode dar, a nós e aos nossos alunos, e a toda a comunidade onde eles se inserem? Se numa sociedade tão cheia de stress e ansiedade a música pode ser tão boa e restauradora para nós, será que a podemos usar para investir, precisamente, numa sociedade melhor? Onde começa uma sociedade melhor, e que papel poderá o ensino musical ter na escrita dessa história?

 

Introdução: a Música Comunica e Gera Comunidade

As tentativas de explicar a origem da música são deveras especulativas, e, porém, não deixam de estar intrinsecamente associadas aos conceitos de comunicação e comunidade (Blacking (1975), Nettl (2005)). Deveras, hoje, poucos serão aqueles que, ao longo da sua vida, nunca ouviram que “a música é a linguagem universal do Homem”, ou alguma outra frase semelhante. Nettl (2005) descreve que a universalidade e a comunicatividade da música eram, no século XIX, largamente aceites e pressupostas, mas que, com o passar do tempo, foi-se percebendo: a música em tudo o que ela significa não é categoricamente universal, mas, ainda assim, há uma estrutura profunda que nos conecta a todos enquanto seres humanos, fazendo intuitiva a observação de que há universais na música. John Blacking foi um dos autores de referência nessa nova onda de perspetiva. Em 1973, ele apontou o modo como parece haver um consenso quase intuitivo de que a música é universal e comunicativa, estando isso especialmente evidente em áreas como a religião, o marketing e a cinemática.

"My" society claims that only a limited number of people are musical, and yet it behaves as if all people possessed the basic capacity without which no musical tradition can exist – the capacity to listen to and distinguish patterns of sound.[i]

 

Outros académicos têm sido capazes de descrever a música como servindo-se de mecanismos humanamente universais, tornando-se, assim, um sistema simbólico através do qual pode haver algum nível de comunicação, pelo menos emocional e a nível intercultural (Blacking (1973), Harwood (1976), Balkwill & Thompson (1999), Dobbins (2004), Balkwill, Thompson e Matsunaga (2004)). A música tem, inclusive, a capacidade de promover valores prejudiciais para uma comunidade – através do contexto em que é produzida, financiada e apresentada (Dave, 2014).

De facto, Blacking (1973, p. 25) corrobora a ideia de que a música já não pode ser vista como apenas uma coisa em si mesma, e não pode ser analisada isoladamente, pois “ethnomusicology makes it clear that musical things are not always strictly musical, and that the expression of tonal relationships in patterns of sound may be secondary to extramusical relationships which the tones represent.”[ii]. A música, isto é, aquilo que se considerar musical, está, portanto, intimamente conectado com o aspeto relacional da humanidade.

Então, começam a ganhar forma as questões de maior interesse: o que é que a música comunica, quanto é que ela pode comunicar, e como comunica? Em específico, como pode a música ser usada para comunicar conceitos complexos em contextos sociais, e até interculturais? Face ao estado da arte, o interesse nas questões colocadas poderá vir a prender-se com as possibilidades educativas que advêm da problemática da comunicatividade da música. Por outras palavras, como pode a comunicatividade da música ser usada para beneficiar e enriquecer contextos musicais educacionais? Essa é uma questão que se dirige à perceção consciente que as pessoas têm da música enquanto processo interativo e comunicativo.

 

Comunicação Musical a um Nível Básico

Partindo do terreno estabelecido pela investigação já feita, onde nos é permitida margem para assumir que a música é comunicativa com pelo menos algum nível de universalidade (Harwood (1976), Dobbins (2004), Balkwill, et al. (2004), Morrison & Demorest (2009), Cross (2014), Dave (2014)), surgiram as questões: será que a música pura tem o poder de transmitir ideias? E será que todas as pessoas têm a mesma perceção nesse assunto?

Para responder a essas questões, em 2020 a autora do presente relatório elaborou uma pesquisa cujos resultados sugeriram que o material musical em si pode evocar sentimentos, pensamentos, e lições de vida associadas a valores, com unanimidade surpreendente em indivíduos de diferentes idades, culturas, níveis de formação musical, entre outros fatores. Em consonância com pesquisa anterior supracitada, observou-se que tal homogeneidade de perceções quanto à comunicação da música a níveis tão profundos quanto “valores, virtudes, e princípios de vida” deriva principalmente de duas realidades: a presença de universais no processamento acústico da música, e o impacto da globalização na quantidade de experiências, ideias, e crenças partilhadas entre pessoas de backgrounds distintos. Estas conclusões deixam espaço para admitir que é viável ver a música como um veículo para a comunicação não só de emoções abrangentes, mas também de ideias complexas e concretas, como “valores de vida”.

 

 Definição de Termos

É neste ponto que se torna deveras relevante definir o que se entende por “valor”. O conceito de “valor” pode ser entendido como significando “um ideal”, “um princípio de vida”; uma conceptualização daquilo que se considera ser eticamente verdadeiro e desejável (Kluckhohn, citado em Rokeach, 1979, p. 48). Mais que isso, a um nível mais profundo e menos consciente, valores são máximas que fluem das crenças basilares de um grupo de indivíduos e se impregnam na cosmovisão dessa mesma comunidade, providenciando um padrão de virtudes (Williams, citado em Rokeach, 1979, p. 48) sociais, ideológicas, políticas e religiosas que regem o comportamento, atitudes, e perceções dos indivíduos (Festinger, citado em Rokeach, 1979, p. 48). Este é claramente um domínio complexo da vivência humana.

Para os propósitos da pesquisa elaborada, adotou-se o esquema elaborado por Rokeach (1979), onde o autor denota uma diferença entre “valores terminais” e “valores instrumentais”: os primeiros referir-se-iam a estados finais idealizados, isto é, características que se creem valer a pena lutar por atingir; os segundos, conceções ou crenças sobre os modos de comportamento desejáveis para atingir os tais estados idealizados. Em 1973, Rokeach propôs uma lista de Valores Individuais para a sua Value Survey. Nesse modelo (cuja validade é defendida em várias fontes citadas em Rokeach, 1979, p. 50), o autor inclui os seguintes conceitos: “true friendship, mature love, self-respect, happiness, inner harmony, equality, freedom, pleasure, social recognition, wisdom, salvation, family security, national security, a sense of accomplishment, a world of beauty, a world at peace, a comfortable life, an exciting life”[iii] como Valores Terminais, e, como Valores Instrumentais, “cheerfulness, ambition, love, cleanliness, self-control, capability, courage, politeness, honesty, imagination, independence, intellect, broad-mindedness, logic, obedience, helpfulness, responsibility, forgiveness”[iv].

Tanto os valores terminais quanto os instrumentais são hierarquizáveis, e manifestam-se tanto numa dinâmica individual como supraindividual. “The concepts of value are profound and difficult exactly because they do two things at once: they join men into societies, and yet they preserve for them a freedom which makes them single men”[v] (Bronowski, 1956, p. 70). Quer-se, portanto, demonstrar que, ao evocar o conceito de “valores”, está-se a referir a uma dimensão profunda e essencial, sobremaneira subjetiva, porém inegável, da existência humana.

 

Comunicação Musical a Níveis Mais Complexos

Por Inerência

Os conceitos até aqui explorados preparam o caminho para prosseguir a análise de como a música tem sido usada para comunicar a níveis mais complexos da experiência humana. Autores como Carr (2006), Cross (2014), Miles, Nind, Henderson, & Macrae (2010), Miles, Nind, & Macrae (2009), e McNeill (1995) direcionam-nos para a ideia de que a música comunica e transmite valor pelas suas meras características intrínsecas enquanto forma de arte (apresentando uma oportunidade de abstração) e entretenimento (propiciando a sincronia comunitária), incluindo a sua “floating intentionality” (“intencionalidade flutuante”, isto é, ambiguidade que permite diversos ouvintes fazerem interpretações diferentes, coexistindo sem desacordo). Apesar de esse enriquecimento ser, pelo menos em parte, subjetivo, parece seguro afirmar que a música, por si só, tem a potencialidade de promover valores/princípios como o da união, liderança cooperativa, respeito, autoexpressão e escuta ativa, adaptação recíproca, organização e consenso.

Merriam (1964) aponta uma lista de possíveis funções abstratas da música: “emotional expression, aesthetic enjoyment, entertainment, communication, symbolic representation, physical response, enforcing conformity to social norms, validation of social institutions and religious rituals, contribution to the continuity and stability of culture, and contribution to the integration of society”[vi] (p. 219). Nesse sentido, Nettl (2005) confirma que a música, muito além de ser um mero capricho estético, apresenta um propósito maior nos contextos em que é usada, e serve, em todas as culturas, dois propósitos derradeiros (p. 253): mediar o relacionamento do Homem com o sobrenatural, e suportar a integridade de grupos sociais ao expressar em forma abstrata os valores centrais da cultura.

A música, portanto, tem sido vista pela etnomusicologia como, acima e apesar de tudo, um veículo comunicativo e preservador da identidade de uma comunidade. Blacking (1973) comenta que a cultura não é um fim, mas um meio, e um meio para que o Homem viva para além dela. E esse pensamento é interessante na medida em que nos aponta para a ideia de que a música, enquanto meio de expressão cultural tão inerente e transversal à Humanidade, não deveria ser um fim em si mesma, mas um meio, um veículo, para que através dela o Homem atinja propósitos mais elevados. O mesmo autor expressa que, entendendo o que a música é, poderemos avançar para usá-la e desenvolvê-la de maneiras que ainda nunca tínhamos imaginado, mas que lhe podem ser inerentes.

 

Por Contexto

O “Cue Redundancy Model” de Balkwill & Thompson (1999) e Balkwill, et al. (2004) chama à atenção para o facto de que, para além de “deixas acústicas”, que são auditivamente processadas da mesma maneira por todos universalmente, a música tem uma dimensão cultural: uma forma de comunicação menos transversal, e mais contextual (Blacking, 1973, p. 31–33). Blacking afirma:

Music can express social attitudes and cognitive processes, but it is useful and effective only when it is heard by the prepared and receptive ears of people who have shared, or can share in some way, the cultural and individual experiences of its creators. Music, therefore, confirms what is already present in society and culture (…).[vii]

 

É relevante considerar a música nesses termos. De facto, as perspetivas dos vários pesquisadores continuam a convergir para a premissa de que a música nunca pode ser pelo Homem produzida, executada, ou escutada com neutralidade. A música é mais que um luxo civilizacional. A música é uma dinâmica social, um veículo relacional; um sistema através do qual, até mesmo sem palavras, se abordam e comunicam os temas mais complexos da experiência humana, que são aqueles que unem o núcleo de uma sociedade de forma implícita, pressuposta, tácita: os valores. Blacking (1973) chega a argumentar em favor da ideia de que a música é, por motivos socioculturais e relacionais, indispensável à sobrevivência da nossa espécie.

Nettl (2005, p. 215, 216) cita Edward B. Tylor para afirmar: “Culture is «that complex whole which includes knowledge, belief, art, morals, law, custom, and any other capacities or habits acquired by man as a member of society.»”[viii] O mesmo autor cita Merriam: “All people, in no matter what culture, must be able to place their music firmly in the context of the totality of their beliefs, experiences, and activities, for without such ties, music cannot exist.”[ix] De facto, se não fosse todo o contexto adjacente e significados atribuídos, em vez de música, chamar-se-ia apenas “som”. Em 2005 (p. 229–231), Nettl conclui que, tal como muitas culturas e grupos de pessoas creem intuitivamente, um sistema musical é sempre “a direct function of the culture that produces it, as it contributes to the general character of the culture”[x].

Parece, portanto, seguro admitir que a música, enquanto comunicativa e veicular para a transmissão e preservação dos valores de um determinado grupo social, pode, pelo menos até certo ponto, ser abordada com mais intencionalidade: intencionalidade por parte daqueles que participam dela enquanto um meio interativo e comunicativo, para que ela própria, a música, cumpra essas suas funções e propósitos – e que, prioritariamente, o faça de maneira benéfica e não prejudicial para uma comunidade (Dave, 2014). Então, como tirar partido dessa possibilidade nos meios educativos musicais? Como é que uma escola de música pode aproveitar as propriedades socioculturais da música para, através da transmissão e preservação de valores, promover o desenvolvimento individual e supraindividual dos seus participantes?

 

A Música como Veículo de Valores no Contexto do Ensino: a Busca pelo Desenvolvimento Individual e Supraindividual

Autores como Elliot (1993) e Welch & McPherson (2012, p. 16) explicam como a música é “básica no design humano”, e compilam evidências de como a educação musical tem o potencial de contribuir significativamente para o desenvolvimento dos alunos. Os autores defendem que a chave para uma educação musical construtiva, acolhedora e habilitante está na mudança de um foco na “endless pursuit of new technical, instrumental, and literacy skills”[xi] para uma conceção que se preocupa principalmente com a busca de interações musicais expressivas, comunicativas e afetivas.

Bowman (2012) amplifica esta perspetiva e explica que “educação” não significa o mesmo que “escolarização”, “instrução” ou “ensino”. Ao contrário dos últimos termos, observa Bowman, a palavra “educação” conceptualiza o processo de ensino e aprendizagem que prepara as pessoas não para um conjunto específico e imutável de aptidões, mas sim para um futuro que é, em rigor, impossível de conhecer ou predizer. Por outras palavras, a educação é o investimento através do qual os alunos são equipados para se tornarem participantes de uma cultura que está eternamente no processo de ser criada. O autor afirma que estas capacidades são altamente valiosas e essenciais para viver bem num mundo humano. North e Hargreaves (2008) exploram o modo como a educação musical parece impactar os seus beneficiários em três níveis (p. 347–348): aptidões musicais diretas (literacia musical e aptidões artísticas), desenvolvimento pessoal (cognição e emoção), e desenvolvimento sociocultural (carácter moral, valores espirituais, e qualidade de vida).

À semelhança de Welch & McPherson (2012), Bowman (2005, p. 29) adverte: “Music making, music study, and music learning may be liberating, empowering, and educational; but they may also serve precisely opposite ends.”[xii] O autor argumenta que o historicamente recente racionalismo técnico no ensino da música no contexto norte-ocidental – a busca por algum conceito de pureza metodológica, a nossa “obsession with musical standards”[xiii], a nossa “apparent inability to conceive of curricular alternatives to conventional practice”[xiv] (p. 30) – se tem revelado nada mais nada menos que a marca do niilismo dos nossos tempos. Bowman crê que que estes paradigmas modernos causam, nos alunos, indiferença, e encenação mecânica em vez de exploração criativa (p. 30). Este mesmo autor urge, então, a que se labore contra a tendência da nossa sociedade em geral, e lança o seguinte apelo aos educadores de música:

What I urge us to consider is that music education properly considered should be emancipatory in nature – an endeavor that frees people from the debilitating notions that values come ready-made; that value-based choices reduce to arbitrary assertions of personal preference; that what most ‘counts’ about music is the ability to execute it with a minimum of errors; or that what ‘counts’ as being musically educated is some kind of standardized knowledge or uniform proficiency.[xv]

 

A linha condutora elaborada até aqui traz-nos a um ponto em que parece legítimo constatar que a música, bem como o contexto em que ela é ensinada, comunica precisamente aquilo que os seus criadores, produtores e educadores têm para comunicar – isso inclui, por vezes, até mesmo o que os mesmos não pretendiam transmitir, e inevitavelmente envolverá também todo o conjunto de pressupostos e expectativas que os tais trazem consigo sobre a natureza da música e da educação. Acima de tudo, a pesquisa existente permite-nos olhar para a música como cheia de potencial para contribuir substancialmente, a um nível nuclear, para a formação e desenvolvimento holístico (muito mais que no âmbito estritamente profissional, mas chegando aos valores, carácter, identidade) daqueles que dela beneficiam – primordialmente, os seus aprendizes.

 

Objetivos e Relevância do Estudo

A pesquisa bibliográfica feita até aqui é, portanto, a base da defesa da relevância do presente estudo. O’Neill (2012, p. 2) expressa que a aprendizagem musical será positiva e significativa apenas quando for mais “inclusive, differentiating, permeable, critically reflective, and integrative of experience”[xvi]. Esta autora refere-se à sua teoria enquanto “transformative music engagement[xvii] e apela a que, em vez de limitar a perspetiva dos aprendizes musicais aos termos da sua performance, se passe a enfatizar o potencial dinâmico de cada indivíduo e das afiliações sociais que promovem a aprendizagem musical. O’Neill cita Wadsworth: “Transformative music engagement is about empowering all of us to take «an imaginary leap from a world ‘as it is’ to a glimpse of the world ‘as it could be’»”[xviii].

E é neste paradigma que se fundamenta a validade – necessidade, até – de procurar uma visão mais profunda e integradora do ensino da música; uma abordagem educativa que procure maior intencionalidade na construção do indivíduo; um paradigma de educação musical que procure, em relação à Música, reconhecer e capitalizar todo o seu potencial comunicativo, relacional, e formativo a um nível mais que puramente musical.

A principal questão, portanto, que se colocou na pesquisa elaborada consistiu no seguinte: de que maneira projetos de educação musical podem tirar melhor partido da possibilidade que a música apresenta de ser usada para comunicar, fomentar, e afirmar valores numa comunidade? De que maneira é que o ensino da música pode ultrapassar o tradicionalmente expectável, e transmitir valores tanto através do ensino de “informação substantiva e aptidões”, como ainda do contexto e ambiente criado, tendo como principal veículo a própria música e tudo o que ela é capaz de construir a nível social?

Visando dar um primeiro passo na transição da formulação teórica para a observação em campo e análise de medidas práticas para investir num meio musical mais envolvente, partiu-se para a observação de um caso em particular: a escola Espaço Vida e Música Portugal (EVM ou EVM Portugal). Como é que valores e princípios de vida são, e se sequer são, comunicados entre professores e alunos no Espaço Vida e Música Portugal? Quais as facilidades e obstáculos a esse mesmo processo, e qual a correspondência entre a informação reunida e as propostas dos autores anteriormente estudados? Como se aplicam no EVM as hipóteses sobre a “instrumentalidade”, ou, até, imprescindibilidade (Blacking, 1973) da música no desenvolvimento de indivíduos e de uma comunidade?

O alvo desta investigação descritiva e exploratória foi, portanto, formular conclusões sobre a possibilidade de potenciar os meios educativos musicais para promover uma comunicação interpessoal profunda, significativa, e positivamente impactante no desenvolvimento pessoal e supraindividual de todos os participantes.

 

Da Metodologia ao Método

Ao procurar uma perspetiva mais holística, profunda, e, portanto, transformativa da educação musical, O’Neill comenta (p. 7): “The problem with positivist assumptions is not so much the desire to create an ordered understanding of music learners; rather, it is the way that music learners are decontextualized and removed from their everyday life learning situations”[xix]. Uma abordagem tão positivista, argumenta a autora, enviesa as expectativas que os educadores colocam sobre o processo de aprendizagem dos alunos – acima de tudo, porque ignora o facto de que “the way music students learn is always transforming in relation to their changing contexts”[xx].

E, de facto, a música é considerada inerentemente comunicativa e eticamente significativa não pelas suas propriedades físicas enquanto som, mas sim pelo que a faz poder ser chamada “música”: a intervenção e perspetiva humana sobre ela. Ou seja, esta sua capacidade de transmitir valores não é necessariamente inerente e inquestionável, mas essencialmente subjetiva. Por conseguinte, o estudo feito propôs-se a registar e analisar criticamente a perspetiva que os envolvidos no EVM têm da comunicação de valores através das experiências musicais fomentadas nessa mesma escola.

Para tal, procurando dados do reino do interacionismo simbólico, optou-se pela observação participante e não-participante, em adição à realização de entrevistas. A observação participante passou pelo envolvimento da investigadora com o Espaço Vida e Música Portugal na condição de docente de violino, e a observação não-participante consistiu no estudo de documentos oficiais do EVM disponíveis online, visando o cruzamento de informações (Holsti e Lewin, em Rokeach, 1979, p. 53, 54).

As entrevistas foram semiestruturadas, e visaram recolher a impressão dos participantes sobre a transmissão de valores no contexto da educação musical do EVM. Entrevistou-se os fundadores do EVM em Portugal, e, de seguida, alguns docentes e alunos. Após o registo da perceção dos participantes, terminou-se com uma análise comparativa entre os resultados da pesquisa bibliográfica, da observação, e das entrevistas, articulando nessa etapa a busca por possíveis novas conclusões. Dado o tema em questão, encontra-se grande valor na recolha de descrições amplas, que possam orientar perspetivas e abrir horizontes sobre a comunicação de valores no contexto educativo musical.

 

O caso do Espaço Vida e Música Portugal

Contextualização do Projeto

O Espaço Vida e Música nasceu no Brasil, na Primeira Igreja Baptista de Curitiba, e, no seu website oficial, afirma:

O Espaço Vida & Música é um projeto sócio-cultural[sic] que oferece um curso de 4 anos de duração, com uma metodologia inovadora e um material didático personalizado. O projeto é pioneiro no trabalho de ensino coletivo de instrumentos e garante uma formação completa, com aulas de instrumento, teoria musical e prática coletiva. 

 

Oferecendo aulas de diversos instrumentos, música de conjunto e teoria musical, originalmente o EVM tem como público-alvo crianças, adolescentes e jovens que se encontram em situações socialmente desfavorecidas, e afirma buscar “um enriquecimento cultural, um resgate social, prevenção contra às drogas e uma mudança na perspectiva[sic] de vida de toda a comunidade.”[xxi]

O projeto chegou a Portugal em 2018 e entrou em parceria com a Igreja Baptista de Parede, a Igreja Baptista do Parque das Nações, e a Igreja Baptista de Queluz. Neste país o objetivo do projeto continuou a visar

(…) trazer, a crianças, adolescentes e adultos, a oportunidade de aprender música e também construir valores de vida tanto pessoal, como formação de caráter e ampliação de horizontes.
Através desta arte pretende-se trazer uma linguagem de desenvolvimento da sensibilidade humana, intelectual e motora, que nos leve a ter uma comunhão melhor com o próximo e com Deus, fazendo a diferença nas igrejas, sociedade e no mundo.[xxii]

 

Pode-se ainda acrescentar que, em Portugal, o EVM foi afiliado pela Fundação Bomfim, estabelecendo agora parceria com o Conservatório Bomfim. No ano letivo de 2021/2022 a escola rondou os 100 alunos e os 13 professores nos seus três polos em Lisboa.

Por toda a parte nas declarações do EVM encontram-se referências a conceitos relacionados com a transmissão de valores de vida. “transformar vidas”, “integração escola-família-comunidade”, “envolvimento da família”, “viver em sociedade”, “música como uma ferramenta de inclusão e transformação sociocultural de comunidades”, “crescimento pessoal”, “princípios sólidos de ética, moral e cidadania”, “transmitir valores”, “autoestima”, “carácter”, “valorização pessoal”, “formação de carácter”.

Portanto, será apenas natural reconhecer que, como o seu próprio nome indica, o Espaço Vida e Música pretende ter, na comunidade onde se insere e nos indivíduos a quem beneficia, um impacto que ultrapassa a formação estritamente musical, mas procura abranger o ser holístico, propondo trazer ao seu público-alvo um novo conjunto de paradigmas e incutindo uma série de valores e virtudes que lhes abram os horizontes para novas oportunidades.

O relato do projeto EVM Portugal adiciona um elemento que não se encontrava diretamente mencionado no website do EVM Brasil: Deus. Mais tarde, na realização das entrevistas, veio-se a confirmar que o teor cristão está originalmente presente no EVM, e a ausência de referência a este elemento no website oficial do EVM Brasil explica-se por motivos políticos e burocráticos.

Apenas a partir da análise dos documentos oficiais do EVM online é possível encontrar uma grande correspondência entre os objetivos e valores do projeto e os conceitos de valores esquematizados por Rokeach na sua Value Survey em 1973: valores como senso de realização, autorrespeito, sabedoria, liberdade, igualdade, responsabilidade, capacidade, abertura de mente, honestidade, coragem, prestabilidade, verdadeira amizade (como promovida no investimento em relacionamentos saudáveis entre os alunos e a sua família e comunidade), felicidade, reconhecimento social e salvação (na ideia de resgate social), segurança nacional (imbuída no propósito de fortalecer as comunidades desfavorecidas), um mundo de beleza e um mundo de paz (na busca de reintegração social através da arte), ambição, perdão[xxiii] (procura-se que os clientes-alvo do EVM beneficiem de novas oportunidades, e não sejam mantidos reféns de um passado desprivilegiado, atribulado e associado à criminalidade), entre vários outros.

 

EVM: Observação Participante

Enquanto docente no Espaço Vida e Música Portugal desde a chegada do mesmo ao país na condição de um projeto-piloto até à data presente, a autora do presente artigo realizou observação participante relativa à transmissão de valores no dia-a-dia do EVM Portugal. Foram observadas[xxiv], essencialmente, cinco áreas de maior investimento por parte do projeto: a religião, a inclusividade intergeracional, a inclusividade económica, a qualidade musical, e o envolvimento artístico e relacional.

 

Transmissão de Valores no Dia-a-Dia do EVM Portugal

Religião

O Espaço Vida e Música nasce no contexto Cristão Evangélico Batista, e essa identidade não é escondida. Foram observadas pelo menos cinco áreas nas quais essa índole é transparecida:

  • As aulas do projeto são levadas a cabo nas instalações das igrejas cooperantes.
  • Os professores que participam enquanto corpo docente do projeto são escolhidos com base na preferência de que partilhem do sistema de crenças associado à fundação do EVM.
  • No final dos ensaios de orquestra, o líder (maestro) faz uma oração (a qual consiste, segundo o Cristianismo Evangélico, numa conversa espontânea com Deus).
  • Nos repertórios instrumentais e orquestrais estão incluídas algumas músicas gospel e respetivo texto.
  • Os recitais finais geralmente incluem um momento de 10 a 15 minutos em que um líder religioso cristão partilha uma reflexão de cariz espiritual.

Com estes pontos, torna-se evidente que o EVM não é um ambiente laico. Posto isto, no tempo de observação participante, o EVM não efetuou qualquer tipo de discriminação – nem por motivos religiosos, nem por outros. Os momentos de teor religioso revelavam-se comunitários, mas não obrigatórios. Por outras palavras, o EVM não se apresenta enquanto um projeto catequético ou propagandista; antes pelo contrário, houve sempre espaço para todos os sistemas de crenças, e cada um foi convidado a participar e agir apenas em consonância com a sua própria consciência: foi, deste modo, evidenciada a promoção do valor “abertura de mente”, a tolerância e a liberdade.

Isto acontece porque a liderança do EVM acredita que os valores defendidos pelo projeto podem ser validamente transmitidos através da cosmovisão cristã, e que esta última terá um impacto positivo na vida dos envolvidos. Na verdade, a ideia transmitida pelos líderes do EVM é que, na sua perspetiva, os valores que defendem fluem precisamente das suas crenças religiosas. Conclui-se este comentário com a apresentação de um conjunto de valores, junto dos respetivos paradigmas da mundivisão cristã que o EVM pareceu utilizar como base para a transmissão dos tais valores – a lista elaborada pode ser encontrada no Anexo A.

 

Inclusividade Intergeracional

Em Portugal, o EVM construiu um ambiente de inegável inclusão a todas as idades, e observou-se que isto foi conseguido através de três fatores principais: a remoção de qualquer limite de idades (exceto o mínimo de 8 anos ou alfabetização), o estabelecimento dos horários em regime pós-laboral, e a promoção do EVM enquanto oportunidade educativa dirigindo-se explicitamente também a indivíduos de faixa etária mais avançada. Tornou-se possível induzir que esta inclusividade intergeracional ajudou a desenvolver, ou, no mínimo, potenciar, na maioria dos alunos, um espírito de cooperação, respeito, e enriquecimento mútuo.

 

 Inclusividade Económica

A norma preferida para as aulas de instrumento no EVM, especialmente no que toca aos níveis iniciantes, é a realização de aulas em grupo. Para além de uma filosofia subjacente de cooperação e motivação mútua, as aulas de grupo representam uma preocupação pragmática a nível financeiro: fazer o trabalho dos professores render, para que as aulas possam ser mais baratas. E, de facto, o preço das propinas no EVM é cerca de três a quatro vezes mais barato do que o cobrado por outros conservatórios de referência em Portugal. Em adição, o EVM incentiva as comunidades onde se insere à doação de instrumentos musicais, e é desse modo que a escola obtém uma parte significativa dos seus recursos materiais. É possível comentar que tal postura, por parte do EVM Portugal, evidencia uma rejeição do elitismo na música, e foi observado que estes princípios tenderam a promover uma atitude comunitária de investimento, partilha, e produção de riqueza. A inclusão económica abre, para toda uma outrora desfavorecida classe socioeconómica, as portas do direito fundamental à educação e ao enriquecimento cultural e intelectual.

 

Qualidade Musical

A verdade é que a excelência artística não é, assumidamente, a principal prioridade na hierarquia de objetivos e valores do EVM. Posto isso, em meio a toda a inclusão e diversidade, a qualidade musical não é, de todo, negligenciada. A ênfase sociocultural do projeto não vem em detrimento do brio e disciplina nas aptidões musicais por parte dos alunos que a tal almejarem. Todos os alunos são simultaneamente incentivados a dar o seu melhor, e a não desprezarem o esforço de ninguém, até mesmo daqueles que não conseguem atingir muito. Isso permite um ambiente onde todos são bem-vindos a participar, e, ao mesmo tempo, encorajados a progredir até ao máximo potencial das suas técnicas diretamente musicais.

O EVM garante aquilo se requer de qualquer escola de música, e registou-se três vias adicionais através das quais, no EVM, se estimula e garante a promoção dos valores diretamente educacionais da “capacidade”, “sabedoria”, “intelectualidade”, “responsabilidade” e “independência”:

  • Contratação de professores profissionais.
  • Criação de espaço para alguma competitividade no âmbito da orquestra sinfónica: atribuição de partes por nível de dificuldade.
  • Formação de grupos de música de câmara constituídos de apenas os alunos mais avançados.

 

Envolvimento Artístico e Relacional

Por vezes, as pequenas coisas fazem uma grande diferença. O EVM introduz no seu ambiente uma série de fatores que contribuem para a manutenção de um contexto seguro, amigável, familiar e envolvente. Isto aplica-se não só à envolvência do aluno com a música (ao invés de a encarar como uma entidade meramente estética), como ainda à envolvência interpessoal, entre alunos, professores e familiares. Em contribuição direta para este ambiente, destacam-se cinco atitudes observadas.

  • Importação de alguns elementos do método Suzuki: em especial, priorização do envolvimento musical auditivo acima do virtuosismo técnico.
  • Ênfase nas atividades de grupo: a orquestra sinfónica é apresentada enquanto o elemento central da escola, e nela são incluídos todos os alunos de todos os níveis. Esta dinâmica parece criar um ambiente de grande respeito e cumplicidade entre pessoas de diferentes enquadramentos, tanto sociais como técnicos.
  • Abertura a e inclusão de todas as idades. A intergeracionalidade fortalece e enriquece o grupo porque dinamiza a partilha de experiências e conhecimento.
  • Convites intencionais a que toda a família, próxima e estendida, assista aos recitais finais, e criação de um ambiente de recital onde há espaço para o envolvimento comunicativo da audiência.
  • Para o intervalo de 15 minutos antes dos ensaios de orquestra, todos os envolvidos são encorajados a trazer um lanche para partilhar, promovendo-se um tempo de confraternização. O lanche é gratuito para todos os presentes, e foi observado que momentos como estes fortalecem, efetivamente, os laços interpessoais, e contribuem para uma sensação geral de que o EVM é um ambiente agradável, envolvente e edificante a nível pessoal e interpessoal.

 

Conclusão da Observação Participante

O modo como o EVM valoriza a experiência comunitária e familiar, as atitudes que toma para apelar a um envolvimento musical holístico, e a decisão de dar ênfase a um desenvolvimento que afeta positivamente todas as áreas da vida e não apenas a profissional ou musical – tudo isto, em geral, e cada atitude, em particular, vai ao encontro do defendido por Elliot (1993), Bowman (2005 & 2012), Carr (2006), North & Hargreaves (2008), Welch & McPherson (2012), e O’Neill (2012): de que a educação musical terá possibilidades de atingir o seu máximo potencial apenas quando for encarada enquanto uma atividade sociocultural, através da qual os alunos não são apenas instruídos musicalmente, mas, e principalmente, são chamados a um envolvimento holístico que os integra numa cultura e contribui para a formação do seu carácter a nível ético e moral. O foco no envolvimento interpessoal parece, acima de tudo, contribuir para a promoção do valor instrumental da “alegria”, e do valor terminal do “amor amadurecido”: um compromisso intergeracional, inclusivo, não discriminatório, e sustentador do sucesso de todos, sendo que cada um contribui com o valor pessoal, relacional e cultural que traz consigo.

 

A Perceção dos Envolvidos: Entrevistas e Análise

Num passo seguinte, procurou-se cruzar a observação pessoal da investigadora com a experiência de alguns membros-chave da comunidade EVM: fundadores e diretores do Espaço Vida e Música em Portugal (Diretor, músico, e Diretora, auxiliar), alguns docentes, Secretária do projeto, e ainda alunos, pais de alunos, e uma auxiliar. As entrevistas conduzidas indagavam o indivíduo sobre a sua perceção de o que é o EVM, de quais interpreta serem os objetivos deste projeto, que valores se fomentam no EVM, que estratégias são empregues para tal propósito, e que resultados a escola tem obtido nesse mesmo empreendimento (perceção de impacto no próprio, e nos outros envolvidos).

Inclui-se agora uma sintetização dos conceitos-chave mencionados pelos participantes. Para cada secção, elaborou-se duas tabelas (Anexo B) que resumem o cruzamento de conteúdos entre as palavras desses últimos e os dados recolhidos pela observação participante, e integram os conceitos da RVS que tais estratégias incorporam.

 

Entrevista aos Fundadores

Quando questionados sobre os valores que o EVM pretende incutir nos seus alunos, o casal de fundadores e diretores do EVM em Portugal mencionou a procura de um propósito de vida, o ânimo, a inclusão intergeracional, a integração, a sensibilidade para a humanidade, a permissão para que cada um avance ao seu ritmo, o valor da comunidade e dos laços familiares, e o apoio mútuo.

É interessante salientar a afirmação que a Diretora fez: “a principal ferramenta do Espaço Vida e Música é o amor”. O reflexo desse amor, segundo Diretora, está no modo como todos os envolvidos se demonstram presentes, disponíveis, prestáveis, e dignos da confiança dos alunos. Diretor e Diretora consideram que “a proposta do EVM é ensinar valores de vida” e transmitir algo holisticamente valioso “independentemente de religião”. “Ser uma boa pessoa e fazer o bem a quem está a seu lado.”

Em suma, a perspetiva dos diretores do EVM parece ser largamente sobreponível ao previamente observado. Diretor e Diretora afirmam desejar transmitir e incutir, nos alunos do EVM, valores de vida profundos e que ultrapassam os meramente educacionais.

A formação de carácter e o fortalecimento da comunidade, para os fundadores do EVM, não são um mero produto colateral da aprendizagem da música: pelo contrário, são encarados como propósitos principais, a par da educação musical. Para atingir tais objetivos, os diretores têm delineadas estratégias que se baseiam no pressuposto de que os valores-chave serão transmitidos num ambiente de envolvimento relacional, e não somente através de técnicas ou métodos educativos.

O casal de fundadores expressa a perceção de que o seu trabalho não tem sido em vão: creem que tem havido grande enriquecimento da comunidade através do EVM, e interpretam isso como o sucesso do projeto. Este é um passo favorável em direção à conclusão de que o ambiente de educação musical pode ser potenciado para ter na vida dos envolvidos um impacto que ultrapassa a mera formação cognitiva-musical e a abertura de horizontes profissionais. A perceção dos participantes seguintes diz-nos se o EVM tem, de facto, conseguido transmitir valores mais profundos da experiência humana a nível relacional.

 

Entrevistas a Docentes e Secretária

De seguida entrevistou-se docentes e a Secretária do Espaço Vida e Música. Diretor e Diretora expressaram confiança de que este corpo docente assimila e representa bem os objetivos do projeto.

Os professores e Secretária entendem o EVM como uma escola de vida onde a música é tanto um fim, em si mesma, como um meio – para a preservação da comunidade e para a formação dos seus participantes em torno de determinados valores. Ênfase foi dada à inclusão social e à rejeição do elitismo, bem como à amizade, a entreajuda, e a honestidade. Segundo vários entrevistados, é da cosmovisão cristã que fluem os mais importantes valores promovidos pelo EVM: “o valor da vida”, que existe esperança, um propósito, um sentido, uma razão de viver, bem como “o amor ao próximo”, um amor íntegro e autossacrificial.

Em comparação com os fundadores, os professores deram mais ênfase à parte que lhes compete diretamente, que é a atitude na interação com os alunos: tanto docentes como secretária afirmaram que o mais importante no EVM é a humildade e a sensibilidade para o outro, e que, portanto, há espaço para um relacionamento de amizade entre alunos e professores. Uma docente descreveu que a sua estratégia é que os alunos percebam que “vão ter aula de instrumento, mas que também têm ali um porto seguro. Um sítio onde podem desabafar alguma situação, algum problema”. A Secretária expressou que o objetivo final do EVM é “que [os alunos] se sintam amados”.

Para além disto, vários docentes confessaram ser impactados, eles próprios, pelo EVM a um nível pessoal. Alguns viram-se mais predispostos para “lidar com o aluno enquanto indivíduo, enquanto pessoa”, outros expressaram sentir-se especialmente amados e valorizados naquilo que fazem. Em geral, a sua perceção em tudo se assemelha à dos diretores, inclusive no sucesso que interpretam que o EVM tem tido na transmissão de valores. De seguida, verifica-se isso mesmo.

 

 Entrevistas a Alunos, Pais de Alunos, e Auxiliar

Foram entrevistados vários alunos de diversos géneros e idades, bem como encarregados de educação e uma auxiliar do projeto. Foi, de novo, repetida por vários a acessibilidade do preço do EVM e o valor encontrado na inclusão intergeracional. Alunos mais velhos admitiram-se gratos, motivados, e potenciados pela ausência de preconceitos no EVM. Também foram destacados os valores de interajuda e cooperação, em vez de competição.

É de destacar abrangência de estratégias que os alunos, pais de alunos, e a auxiliar Auxiliar, no seu conjunto, mencionaram, e o quanto o mencionado por eles se sobrepõe às estratégias previamente observadas. Posto isso, é curioso notar o realce dado pelos participantes aos dois tópicos: a atitude dos professores e a hora do lanche. Os alunos testemunharam sentirem-se motivados e beneficiados, tanto a nível académico e musical como pessoal e interpessoal, pela amizade que constroem com os seus docentes e pela atitude que sentem que estes últimos têm para com eles. Percecionam serem ouvidos, encorajados, aceites, validados: numa só palavra, “amados” – e sentem que isso lhes faz mais felizes, e lhes ensina sobre a importância de valores como a união e a inclusão. Estes valores também se manifestam com primazia, segundo os alunos e auxiliar, no momento do lanche – um elemento, que, direta ou indiretamente, foi mencionado por quase todos os entrevistados nesta pesquisa, e entendido como fulcral para a promoção do convívio e comunhão entre os participantes. A auxiliar – tendo, ela mesma, um papel essencial na preparação do lanche – afirma que a visão que tem para este momento é de que as necessidades dos alunos sejam supridas, e que eles sintam que tudo no projeto é concebido para o bem deles.

 

 Conclusão

Analisando os resultados das entrevistas, é notório o quão todos os participantes, embora indivíduos tão diversos entre si, parecem estar “na mesma página” quanto às suas perceções do que acontece no EVM. Foi possível observar que um largo conjunto de valores que o EVM afirma desejar promover tem sido, de facto, definidor das atividades do Espaço Vida e Música, e os clientes desta escola percecionam-no como tal; mais ainda, sentem-se envolvidos na atmosfera criada, e creem beneficiar dela a níveis profundos do ser. É nesta medida que as perceções dos participantes sugerem que o Espaço Vida e Música tem sido capaz de transmitir e reforçar valores de vida.

E, sendo esse o caso, o projeto tem-no feito com recurso a uma panóplia de estratégias: desde a postura dos docentes em sala de aula, até à comunicação verbal nos eventos, passando também por momentos que integram convívio social no ambiente de educação musical (como é o exemplo do lanche), e chegando a paradigmas estruturais do projeto (como a decisão de aceitar como alunos pessoas de qualquer idade, ajustando o ensino ao ritmo de cada um). Concluiu-se que, no conjunto da perceção de todos os entrevistados, todas as estratégias enumeradas são percecionadas como tendo um impacto positivo e decisivo na transmissão dos valores que o EVM pretende inculcar.

Entre as filosofias e estratégias registadas encontram-se algumas mais convencionais ou comuns, mas também outras inovadoras e contracultura no contexto musical erudito. Aproveitando a oportunidade, será proveitoso dedicar um momento à análise do tão bem-reputado lanche. Comer, à semelhança de fazer música, é uma prática milenar, básica e transversal a toda a Humanidade, e que se apresenta essencial à preservação da espécie não só a nível de sustento físico, mas também por ser um evento social onde se partilham experiências de vida e se definem e fortalecem os laços do grupo. Como afirmou o professor Docente 4, “O EVM faz uma ponte social entre pessoas que, se não fosse o EVM, não teriam ponto de contacto, nem tema de conversa.” – a hora do lanche parece ser um momento climático desta faceta do Espaço Vida e Música.

É ainda proveitoso realçar o elemento de amizade entre professores e alunos. No meio educativo profissional, os aspirantes a professores são frequentemente encorajados a não se apresentarem como um amigo para o aluno – sem negligenciar a cortesia, o respeito, e a disponibilidade relacional necessária, os professores são urgidos a manter o profissionalismo do relacionamento. O EVM, contudo, defende valores muito claros quanto à importância da comunidade, e encoraja os professores a não apenas se sentirem à vontade para serem amigos dos seus alunos, como a o encararem como um dever. O facto de os alunos se sentirem positivamente impactados pela amizade que desenvolvem com os professores pode encaminhar-nos para a conclusão de que, em consonância com o que os autores estudados teorizaram, um envolvimento relacional no ambiente musical educativo é o que nos permitirá elevar o ensino da música a todo o potencial que esta mesma permite para a humanidade, rompendo com o elitismo e niilismo que se têm apoderado do ambiente musical no Ocidente.

No capítulo “5.3.1. Entrevista aos Fundadores” foi colocada a observação de que a formação de carácter e o fortalecimento da comunidade, para os diretores do EVM, não são um mero produto colateral da aprendizagem da música: pelo contrário, são encarados como propósitos principais, a par da educação musical. A investigação permitiu concluir que, por isso, no EVM a música torna-se uma atividade mais relacional e envolvente do que seria numa escola com diferentes valores. A primeira consequência é que a música passa a ser encarada e vivida de forma despretensiosa e acessível a todos.

Portanto, uma importante conclusão a que se chega como resultado da presente pesquisa prende-se no facto de que estratégias que priorizam o envolvimento relacional farão do ambiente educativo musical mais cheio de significado e mais proveitoso e construtivo para os seus integrantes, tanto a nível académico como pessoal e interpessoal. O ideal de que a música é para todos deixa de ser apenas uma utopia teórica: no EVM, a música torna-se, de facto, acessível a todos – ou, pelo menos, acessível a muitas mais pessoas do que seria a partir de um conservatório convencional, e isso é um passo na direção que se pretende com pesquisas como esta.

De facto, a forma como o EVM encara o ensino da música transfere a sua escola do plano do mero ensino para o plano da educação, e educação para a vida. Este envolvimento, não só técnico, nem só musical, mas relacional e interativo (como idealizado por Elliot (1993), Bowman (2005 & 2012), Carr (2006), North & Hargreaves (2008), Welch & McPherson (2012), e O’Neill (2012)) parece, na verdade, ser o ponto de viragem para a transformação de uma escola de música num ambiente que promove – para além da literacia ou virtuosismo musical – o desenvolvimento pessoal e interpessoal dos alunos. É desta forma que se crê que o estudo do caso do EVM vem contribuir para este processo de “ressignificação” do ensino da música, rumo a uma perspetiva mais envolvente e consciente do potencial sociocultural da música em si.

Apesar de ser apenas um pequeno passo numa longa caminhada de pesquisa, o presente estudo gerou novas reflexões que contribuem favoravelmente para a conclusão de que a música, quando vivida de acordo com o seu potencial universal e comunitário, e não apenas como um capricho civilizacional (Bowman, 2005), pode ter um papel fundamental na estruturação dos valores nucleares de um indivíduo, integrando-o num todo e preservando a sobrevivência da comunidade, sem a qual o Homem nada é.

 

Limitações e sugestões para futura pesquisa

O ambiente do Espaço Vida e Música Portugal é pequeno, pessoal e específico, o que coloca limitações acrescidas na objetividade das descobertas. Recomenda-se vivamente que futuros estudos nesta área (tanto sobre o EVM como sobre outros contextos) e deste cariz sejam levados a cabo não apenas por um indivíduo, mas por uma equipa de investigadores académicos, em que pelo menos um não esteja tão intimamente envolvido com o objeto de estudo. Seria também importante levar a cabo pesquisa que incluísse questionários de medição objetiva de valores.

Semelhantemente, uma grande fragilidade deste estudo é o facto de que a maioria das pessoas entrevistadas já estavam integradas numa comunidade cristã (em específico, nas igrejas anfitriãs do projeto) antes da chegada do Espaço Vida e Música a Portugal. Isto pode sugerir que, até certo ponto, muitas das pessoas se sentem integradas porque, na verdade, já o estavam, previamente. Argumenta-se que, na presente pesquisa, esta limitação pode ser contrabalançada pelos elementos que se seguem.

  • Os entrevistados, mesmo que estivessem anteriormente integrados na comunidade eclesiástica, descreveram o impacto positivo do EVM nas suas vidas fazendo menção a aspetos extremamente específicos e únicos do EVM.
  • As partilhas dos entrevistados não incluíram apenas testemunho sobre a sua experiência em primeira mão, mas abrangeram as suas perceções sobre a reação de visitantes e novos membros (não previamente integrados numa comunidade cristã) ao EVM.
  • Foi possível entrevistar uma aluna de violino que antes de entrar no EVM não fazia parte de nenhuma igreja, e tinha um sistema de crenças diferente do promovido pelo EVM. De acordo com o seu próprio testemunho, esta aluna é um dos vários casos de integração bem-sucedida na comunidade, expressando ter experienciado uma transformação de vida. Em adição, um docente descreveu uma experiência semelhante, embora noutros moldes. Estes casos dão credibilidade qualitativa à perceção dos outros participantes.

Postas estas razões, recomenda-se que se continue a observar o EVM, e, em particular, que se faça um estudo de acompanhamento de alguns dos seus participantes – em particular, alunos –, para entender o seu “antes” e “depois” do envolvimento com a instituição de forma mais objetiva. Da mesma forma, será interessante investigar outras instituições sob os mesmos parâmetros, incluindo na amostra escolas que declarem defender valores semelhantes, bem como instituições que não se proponham a transmitir os mesmos valores em particular, e com essas fazer um estudo comparativo.

Sendo que os envolvidos no EVM interpretam os valores promovidos nesta instituição como fluindo da cosmovisão cristã, questões devem ser colocadas: até que ponto é a influência cristã indispensável para que se crie tal ambiente de comunhão entre os participantes e envolvimento musical? Que resultados e efeitos se atingiriam se se implementassem as mesmas estratégias numa escola laica? Estas e outras questões poderão guiar futura pesquisa que se concentre em averiguar a verdadeira extensão da influência da cosmovisão cristã na maneira de conceber a música e as atividades musicais.

Utilizando a pesquisa a seu favor e tendo um impacto positivo cada vez mais significativo nas comunidades onde se insere, crê-se que o Espaço Vida e Música tem potencial para continuar a ser um projeto pioneiro no movimento de renovação do ambiente educativo musical, com base na redescoberta da importância da música na vida das pessoas, como indivíduos e como comunidade.

 

 Epílogo: Reflexão Final

A música é uma atividade comunitária, tanto na sua essência como nos seus mais sublimes propósitos. Ao longo dos séculos, a sociedade Ocidental altamente urbanizada e motivada por um ritmo alucinante de produção e consumo tem vindo a deixar que o mundo da música seja prejudicado por conceitos como a “ultra-especialização”, o individualismo, e o niilismo. A obsessão pelo virtuosismo técnico e a indisponibilidade para desafiar paradigmas tradicionais têm gerado no meio da música erudita um elitismo que deixa mais pessoas fora do que dentro, e muitas vezes desmotiva e prejudica as que têm o privilégio de ser incluídas. Porém, o potencial da música vai muito além de qualquer conceito de “técnica perfeita”, e o mesmo torna-se verdade para o ensino musical.

A música pode ser um veículo para a preservação da integridade de uma comunidade e seus valores, trazendo um benefício sólido para os músicos não apenas a nível estritamente musical-académico, mas a nível pessoal e relacional. O estudo empreendido trata-se de uma adesão ao esforço académico de anos recentes, que caminha no sentido de reinterpretar e renovar a educação musical de modo a tirar partido de todas as dimensões ontológicas da música, especialmente aquelas que têm sido mais negligenciadas nas nossas sociedades.

O Espaço Vida e Música é exemplar no seu esforço de reconhecer essa possibilidade inerente à música, e, em alguns sentidos, pode-se dizer que é pioneiro neste ainda nascente movimento de potencialização do sistema de ensino da música. O EVM responde às perguntas colocadas pela presente investigação com uma afirmação de que, sim, o ensino da música pode ir mais além do que normalmente vai, e impactar uma comunidade tão profundamente quanto ao nível dos seus valores centrais e, por assim dizer, “supra-educacionais”. O EVM sugere que a chave está em investir nos relacionamentos, e, no seu caso, o resultado é um grupo de indivíduos simultaneamente mais envolvidos na música e uns com os outros.

O estudo do caso do EVM contribui, então, para este processo de busca de um meio de educação musical mais envolvente e significativo. Adicionado às observações e teorias de autores anteriores, o EVM representa um pedaço de evidências de que vale a pena continuar a pensar e investir neste sentido. Tanto evidenciando a perceção que os membros do EVM têm da eficácia das filosofias desse projeto, como fornecendo uma lista das estratégias práticas implementadas pelo mesmo, o presente estudo poderá servir a quem pretender abraçar o empreendimento de criar um ambiente musical cada vez mais construtivo e impactante a níveis profundos da existência humana – a quem pretender formar alunos não apenas mais capazes, mas mais felizes.

Se a música tem a capacidade de transmitir algo mais que o mero som, se ela pode ser veículo para a comunicação intencional de valores e virtudes, e se o ensino da música pode ter, na vida dos seus envolvidos, um impacto ainda mais significativo do que o que até hoje se tem assumido possível, então, que o nosso ensino da música não seja um mero ganha-pão, mas um contributo para o núcleo da identidade da comunidade onde nos inserimos. Que encaremos a música não apenas como uma organização estética do som, mas como um veículo para a formação ética de uma sociedade. Que olhemos para o ensino musical não como uma mera fábrica de produção de músicos, mas como uma escola de pessoas: seres holísticos, relacionais, com necessidades para além das técnicas, e valor para mais que uma profissão. Que sejamos intencionais ao formar músicos “virtuosos” – não por capricho, mas por profundidade no conteúdo do seu carácter. Que as escolas de música não sejam apenas uma extravagância cultural onde reina a competitividade, mas sim um mundo rico em humanidade; uma incubadora de um futuro melhor, mais belo, mais justo, e mais feliz.

 

 

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Welch, G. F., McPherson, G. E. (2012). Introduction and Commentary: Music Education and the Role of Music in People’s Lives. In Gary McPherson and Graham Welch, (eds.), The Oxford Handbook of Music Education, vol. 1, 5–20. New York: Oxford University Press.

 


Anexos

[Anexo A – lista de valores observados e correspondentes fundamentos cristãos, de acordo com a liderança do EVM]

  • “Autorrespeito” e “igualdade”, transmitidos na crença implícita de que Deus criou todos os seres humanos iguais e com valor intrínseco.
  • “Um mundo de beleza” e “um mundo de paz” na crença afirmada pelo EVM de que a arte, a música, os instrumentos, e a habilidade humana são criação de Deus, e que, portanto, existe beleza objetiva e a arte não se trata de uma competição, mas de uma busca por uma experiência universalmente unificadora e enriquecedora.
  • “Senso de autorrealização”, “capacidade”, “ambição” e “harmonia interior” na transmissão da crença de que a todos os seres humanos Deus presenteou dons artísticos e comunicativos, e um propósito que só é cumprido quando cada indivíduo busca atingir o seu máximo potencial.
  • “Responsabilidade”, “honestidade”, “autocontrole” no pressuposto de que Deus é o derradeiro avaliador da prestação de cada um.
  • “Verdadeira amizade”, “cortesia” e “prestabilidade” na afirmação de que, em consequência do ponto anterior, há espaço para todos os graus de habilidade, e a atitude geral deve ser não-julgadora, mas de apoio e respeito mútuo, e amor ao próximo.
  • “Salvação” e “prazer” na crença de que Deus deseja resgatar todos os seres humanos do mal e trazê-los a uma vida de total realização e satisfação pessoal e comunitária.

 

[Anexo B - Tabelas de valores identificados no Espaço Vida e Música Portugal]

Tabela 1: Âmbitos e Estratégias (Diretores)

ÂMBITOS E ESTRATÉGIAS OBSERVADAS

ÂMBITOS E ESTRATÉGIAS MENCIONADAS PELOS DIRETORES

RELIGIÃO

·         instalações das igrejas

·         professores que partilhem da mesma hierarquização de valores

·         oração

·         repertórios instrumentais e orquestrais gospel

·         recitais e reflexão de cariz espiritual

RELIGIÃO

·         instalações das igrejas

·         professores que partilhem da mesma hierarquização de valores

·         oração

·         recitais e reflexão de cariz espiritual

INCLUSIVIDADE INTERGERACIONAL

(idades admitidas: limite mínimo de alfabetização, e nenhum limite máximo)

INCLUSIVIDADE INTERGERACIONAL

(idades admitidas: limite mínimo de alfabetização, e nenhum limite máximo)

INCLUSIVIDADE ECONÓMICA

(preço acessível)

 

QUALIDADE MUSICAL

·         Docentes competentes e qualificados

·         Competitividade baseada nos níveis de dificuldade

·         Grupos de música de câmara com alunos avançados

QUALIDADE MUSICAL

·         Desenvolvimento de aptidões intelectuais e motoras, e consequente abertura de horizontes profissionais

ENVOLVIMENTO ARTÍSTICO E RELACIONAL

·         Priorização do envolvimento musical acima do virtuosismo técnico

·         Ênfase em atividades de grupo

·         Inclusão de todas as idades

·         Incentivo personalizado a que a família dos participantes assista aos recitais

·         Lanche

ENVOLVIMENTO ARTÍSTICO E RELACIONAL

·         Priorização do envolvimento musical acima do virtuosismo técnico

·         Ênfase em atividades de grupo

·         Inclusão de todas as idades

·         Lanche

·         “Amor” (priorização dos relacionamentos)

 

Tabela 2: Valores (Diretores)

VALORES ROKEACH OBSERVADOS (VALORES MENCIONADOS OU IMPLICADOS PELOS DIRETORES DESTACADOS A NEGRITO)

VALORES TERMINAIS

VALORES INSTRUMENTAIS

verdadeira amizade

amor amadurecido

autorrespeito

felicidade

harmonia interior

igualdade

liberdade

prazer

reconhecimento social

sabedoria

salvação

segurança familiar

segurança nacional

senso de realização

um mundo de beleza

um mundo de paz

vida confortável

vida entusiasmante

alegria

ambição

amor

limpeza

autocontrole

capacidade

coragem

cortesia

honestidade

imaginação

independência

intelectualidade

prestabilidade

abertura de mente

obediência

responsabilidade

perdão

POSSÍVEIS VALORES EXTRA MENCIONADOS

respeito, integração

 

Tabela 3: Âmbitos e Estratégias (Docentes e Secretária)

ÂMBITOS E ESTRATÉGIAS OBSERVADAS

ÂMBITOS E ESTRATÉGIAS MENCIONADAS PELOS DOCENTES E SECRETÁRIA

RELIGIÃO

·         instalações das igrejas

·         professores que partilhem da mesma hierarquização de valores

·         oração

·         repertórios instrumentais e orquestrais gospel

·         recitais e reflexão de cariz espiritual

RELIGIÃO

·         instalações das igrejas

·         professores que partilhem da mesma hierarquização de valores

·         oração

·         recitais e reflexão de cariz espiritual

INCLUSIVIDADE INTERGERACIONAL

(idades admitidas: limite mínimo de alfabetização, e nenhum limite máximo)

INCLUSIVIDADE INTERGERACIONAL

(idades admitidas: limite mínimo de alfabetização, e nenhum limite máximo)

INCLUSIVIDADE ECONÓMICA

(preço acessível)

INCLUSIVIDADE ECONÓMICA

(preço acessível)

QUALIDADE MUSICAL

·         Docentes competentes e qualificados

·         Competitividade baseada nos níveis de dificuldade

·         Grupos de música de câmara com alunos avançados

QUALIDADE MUSICAL

·         Docentes competentes e qualificados

·         Desenvolvimento de aptidões intelectuais e motoras, e consequente abertura de horizontes profissionais

·         Convite a que músicos profissionais não-docentes participem com a Orquestra do EVM nos seus eventos

ENVOLVIMENTO ARTÍSTICO E RELACIONAL

·         Priorização do envolvimento musical acima do virtuosismo técnico

·         Ênfase em atividades de grupo

·         Inclusão de todas as idades

·         Incentivo personalizado a que a família dos participantes assista aos recitais

·         Lanche

ENVOLVIMENTO ARTÍSTICO E RELACIONAL

·         Priorização do envolvimento musical acima do virtuosismo técnico

·         Ênfase em atividades de grupo

·         Incentivo personalizado a que a família dos participantes assista aos recitais

·         Inclusão de todas as idades

·         Lanche

·         Priorização dos relacionamentos

·         Ambiente de compreensão e honestidade

·         Que os próprios professores vivam os valores que querem transmitir

·         Flexibilidade por parte da liderança

 

Tabela 4: Valores (Docentes e Secretária)

VALORES ROKEACH OBSERVADOS (VALORES MENCIONADOS OU IMPLICADOS PELOS DOCENTES E SECRETÁRIA DESTACADOS A NEGRITO)

VALORES TERMINAIS

VALORES INSTRUMENTAIS

verdadeira amizade

amor amadurecido

autorrespeito

felicidade

harmonia interior

igualdade

liberdade

prazer

reconhecimento social

sabedoria

salvação

segurança familiar

segurança nacional

senso de realização

um mundo de beleza

um mundo de paz

vida confortável

vida entusiasmante

alegria

ambição

amor

limpeza

autocontrole

capacidade

coragem

cortesia

honestidade

imaginação

independência

intelectualidade

prestabilidade

abertura de mente

obediência

responsabilidade

perdão

POSSÍVEIS VALORES EXTRA MENCIONADOS

respeito, integração, afeto, união, humildade, sensibilidade, aceitação

 

Tabela 5: Âmbitos e Estratégias (Alunos, Pais de Alunos, e Auxiliar)

ÂMBITOS E ESTRATÉGIAS OBSERVADAS

ÂMBITOS E ESTRATÉGIAS MENCIONADAS PELOS ALUNOS, PAIS DE ALUNOS, E AUXILIAR

RELIGIÃO

·         instalações das igrejas

·         professores que partilhem da mesma hierarquização de valores

·         oração

·         repertórios instrumentais e orquestrais gospel

·         recitais e reflexão de cariz espiritual

RELIGIÃO

·         instalações das igrejas

·         professores que partilhem da mesma hierarquização de valores

·         oração

·         repertórios instrumentais e orquestrais gospel

·         recitais e reflexão de cariz espiritual

INCLUSIVIDADE INTERGERACIONAL

(idades admitidas: limite mínimo de alfabetização, e nenhum limite máximo)

INCLUSIVIDADE INTERGERACIONAL

(idades admitidas: limite mínimo de alfabetização, e nenhum limite máximo)

INCLUSIVIDADE ECONÓMICA

(preço acessível)

INCLUSIVIDADE ECONÓMICA

(preço acessível)

QUALIDADE MUSICAL

·         Docentes competentes e qualificados

·         Competitividade baseada nos níveis de dificuldade

·         Grupos de música de câmara com alunos avançados

QUALIDADE MUSICAL

·         Docentes competentes e qualificados

·         Desenvolvimento de aptidões intelectuais e motoras, e consequente abertura de horizontes profissionais

ENVOLVIMENTO ARTÍSTICO E RELACIONAL

·         Priorização do envolvimento musical acima do virtuosismo técnico

·         Ênfase em atividades de grupo

·         Inclusão de todas as idades

·         Incentivo personalizado a que a família dos participantes assista aos recitais

·         Lanche

ENVOLVIMENTO ARTÍSTICO E RELACIONAL

·         Priorização do envolvimento musical acima do virtuosismo técnico

·         Ênfase em atividades de grupo

·         Inclusão de todas as idades

·         Incentivo personalizado a que a família dos participantes assista aos recitais

·         Lanche

·         “Amor” (priorização dos relacionamentos)

 

Tabela 6: Valores (Alunos, Pais de Alunos, e Auxiliar)

VALORES ROKEACH OBSERVADOS (VALORES MENCIONADOS OU IMPLICADOS PELOS ALUNOS, PAIS DE ALUNOS, E AUXILIAR DESTACADOS A NEGRITO)

VALORES TERMINAIS

VALORES INSTRUMENTAIS

verdadeira amizade

amor amadurecido

autorrespeito

felicidade

harmonia interior

igualdade

liberdade

prazer

reconhecimento social

sabedoria

salvação

segurança familiar

segurança nacional

senso de realização

um mundo de beleza

um mundo de paz

vida confortável

vida entusiasmante

alegria

ambição

amor

limpeza

autocontrole

capacidade

coragem

cortesia

honestidade

imaginação

independência

intelectualidade

prestabilidade

abertura de mente

obediência

responsabilidade

perdão

POSSÍVEIS VALORES EXTRA MENCIONADOS

união

 


Notas

 

[i] Blacking, 1973, p. 8. Tradução livre da autora: “A «minha» sociedade afirma que apenas um número limitado de pessoas é musical e, contudo, comporta-se como se todas as pessoas possuíssem a capacidade básica sem a qual nenhuma tradição musical existe – a capacidade de ouvir e distinguir padrões sonoros.”

[ii] Tradução livre da autora: “a etnomusicologia torna claro que as coisas musicais nem sempre são estritamente musicais, e que a expressão de relações tonais em padrões de som pode ser secundária às relações extramusicais que os tons representam.”

[iii] Tradução livre da autora: “verdadeira amizade, amor amadurecido, autorrespeito, felicidade, harmonia interior, igualdade, liberdade, prazer, reconhecimento social, sabedoria, salvação, segurança familiar, segurança nacional, senso de realização, um mundo de beleza, um mundo de paz, uma vida confortável, uma vida entusiasmante”.

[iv] Tradução livre da autora: “alegria, ambição, amor, limpeza, autocontrole, capacidade, coragem, cortesia, honestidade, imaginação, independência, intelectualidade, abertura de mente, lógica, obediência, prestabilidade, responsabilidade, perdão”.

[v] Tradução livre da autora: “Os conceitos de valor são profundos e complicados exatamente porque eles fazem duas coisas ao mesmo tempo: eles juntam os Homens em sociedades, e, contudo, preservam-lhes uma liberdade que faz deles Homens individuais.”

[vi] Tradução livre da autora: “expressão emocional, desfrutação estética, entretenimento, comunicação, representação simbólica, resposta física, aplicação de conformidade a normas sociais, validação de instituições sociais e rituais religiosos, contribuição para a continuidade e estabilidade da cultura, e contribuição para a integração da sociedade.”

[vii] Blacking, 1973, p. 54. Tradução livre da autora: “A música pode expressar atitudes sociais e processos cognitivos, mas ela é útil e eficaz apenas quando é ouvida pelos ouvidos preparados e recetivos de pessoas que têm partilhado, ou podem partilhar de alguma forma, com as experiências culturais e individuais dos seus criadores. A música, portanto, confirma o que já está presente na sociedade e na cultura (…).”

[viii] Tradução livre da autora: “A cultura é «aquele todo complexo que inclui conhecimento, crença, arte, moral, lei, costumes, e quaisquer outras capacidades ou hábitos adquiridos pelo Homem enquanto membro da sociedade.»”

[ix] Tradução livre da autora: “Todas as pessoas, em não importa qual cultura, devem ser capazes de inserir firmemente a sua música no contexto da totalidade das suas crenças, experiências, e atividades, pois sem tais laços, a música não pode existir.”

[x] Tradução livre da autora: “uma função direta da cultura que o produz, visto que contribui para o carácter geral da cultura.”

[xi] Tradução livre da autora: “busca infinita por novas aptidões técnicas, instrumentais e de literacia.”

[xii] Tradução livre da autora: “Fazer música, estudar música, e aprender música pode ser libertador, empoderador e educacional; mas também pode servir fins precisamente opostos.”

[xiii] Tradução livre da autora: “obsessão por standards musicais”.

[xiv] Tradução livre da autora: “aparente incapacidade de conceber alternativas curriculares à prática convencional”.

[xv] Bowman, 2005, p. 42. Tradução livre da autora: “Aquilo a que apelo que consideremos é que a educação musical devidamente considerada deveria ser emancipatória por natureza – um empreendimento que liberta as pessoas das noções debilitantes de que os valores vêm já-feitos; de que decisões com base em valores se reduzem a asserções arbitrárias de preferência pessial; que o que mais «conta» na música é a habilidade de a executar com um mínimo de erros; ou de que o que «conta» para se ser musicalmente educado é algum tipo de conhecimento standardizado ou proficiência uniforme.”

[xvi] Tradução livre da autora: “inclusiva, diferenciadora, permeável, criticamente reflexiva, e integrativa de experiência”.

[xvii] Tradução livre da autora: “envolvimento musical transformativo”.

[xviii] P. 18. Tradução livre da autora: “Envolvimento musical transformativo é sobre empoderar-nos a todos para darmos «um salto imaginário de um mundo ‘tal como ele é’ para um vislumbre de um mundo ‘como ele poderia ser’»”.

[xix] Tradução livre da autora: “O problema das assunções positivistas não é tanto o desejo de criar um entendimento ordeiro dos aprendizes musicais; antes, é o modo como os aprendizes da música são descontextualizados e removidos das suas situações de aprendizagem quotidianas.”

[xx] Tradução livre da autora: “o modo como os estudantes de música aprendem está sempre em transformação em relação aos seus contextos mutáveis”.

[xxi] Website oficial do EVM, referenciado na Bibliografia e Webgrafia B.

[xxii] Espaço Vida e Música, no website oficial da Igreja Batista de Queluz, referenciado na Bibliografia e Webgrafia B.

[xxiii] Tradução livre da autora.

[xxiv] É relevante salvaguardar que esta observação se deu anteriormente à pandemia do SARS-CoV-2.