Resumo
O presente estudo foi desenvolvido no Conservatório de Música e Artes do Centro (CMAC), no primeiro período do ano letivo 2018/2019 e teve por base um outro estudo, que consistiu no ensino do órgão sem recurso a partitura a alunos do 1º ao 5º grau e no qual foram notadas grandes diferenças entre os alunos que estavam a iniciar e aqueles que já liam música. Como tal, o principal objetivo desta investigação foi analisar a viabilidade da implementação futura do projeto, no CMAC. Para isso, foi testado pela maioria dos docentes um novo modelo de ensino, através do qual todos os alunos do 1º grau aprenderam sem recurso a notação, em todas as aulas do seu plano de estudos. A análise dos dados extraídos das entrevistas efetuadas, permitiu, por um lado, perceber de que forma os professores se foram adaptando e comprometendo durante todo o processo, por outro, como percecionaram os efeitos do novo modelo de ensino nos respetivos alunos. Os resultados do estudo revelaram que a abordagem sem notação, não só facilitou a aquisição de competências, como também contribuiu para o aumento dos níveis de motivação dos alunos. Mostraram ainda que, à medida que o projeto avançava, os professores foram superando os receios iniciais e ficando cada vez mais confiantes.
Palavras-Chave: Ensino Especializado da Música, ensino do órgão, "tocar de ouvido", modelagem, estratégias pedagógicas.
Abstract
This study was developed at Conservatório de Música e Artes do Centro (CMAC), in the first period of the school year 2018/2019 and was based on another study, which consisted of teaching the organ without score to students from the 1st to the 5th grade and in which major differences were noted between students who were beginning their learning and those who already read music. As such, the main objective of this research was to analyze the feasibility of future implementation of the project at CMAC. To do so, a new teaching model was tested by the majority of the teachers, through which all 1st grade students learned without using notation, in all classes of their school curriculum. The analysis of the data extracted from the interviews made it possible, on the one hand, to understand how the teachers adapted and compromised during the whole process, and, on the other hand, how they perceived the effects of the new teaching model on their students. The results of the study revealed that the approach without notation not only facilitated the acquisition of skills, but also contributed to increasing the motivation levels of the students. They also showed that as the project progressed, the teachers overcame their initial fears and became increasingly confident.
Keywords: Specialised Artistic Education, organ pedagogy, "playing by ear", modeling, pedagogical strategies.
Introdução
No contexto português, salvo raras exceções, na maioria das escolas do ensino especializado, a aprendizagem musical é indissociável da aprendizagem de leitura de notação, sendo o desenvolvimento dessa competência, não só, central no ensino, como também, na maioria das vezes, o ponto de partida para a aprendizagem musical. Apesar disso, muitos alunos apresentam grandes dificuldades em ler música. Comummente, os professores relacionam essas dificuldades com a fraca e lenta progressão na aprendizagem do instrumento.
No entanto, a literatura disponível parece indicar que o problema do insucesso escolar, está a montante das competências de leitura.
Vários dos destacados pedagogos referem que, não só nada na literatura indica uma forte relação entre competências de performance e proficiência na leitura, como a ênfase na notação, sobretudo no início dos estudos musicais, poderá inibir o desenvolvimento da musicalidade em geral e os tipos de competências necessárias para que um músico vença a longo prazo (Klemish, 1970; Wolf, 1976; Sloboda, 1985; Priest, 1993; Gordon, 2000; McPherson e Gabrielsson, 2002; Gudmundsdottir, 2010; Woody, 2012; Carmichael, 2014).
A consciencialização desta realidade e os resultados positivos obtidos num estudo preliminar realizado com dez alunos de Órgão do 1º ao 5º grau, levaram à implementação de um projeto piloto, alargado a todos os alunos do 1º grau do Conservatório de Música e Artes do Centro (CMAC), realizado no ano letivo 2018/2019.
Enquadramento teórico
A dificuldade em ler música, no entender de alguns especialistas, relaciona-se sobretudo com o facto de os alunos não terem adquirido previamente competências auditivas que lhes permitam compreender os fenómenos sonoros representados pelos símbolos musicais (Sloboda, 1978; Priest, 1989,1993; Swanwick, 1994; McPherson e Gabrielsson, 2002; Woody, 2012).
Os mesmos autores esclarecem ainda que, a não aquisição de competências auditivas se deve ao facto de os iniciantes serem confrontados simultaneamente com a leitura de notação e a aprendizagem de um instrumento. Isso, porque a complexidade envolvida no processo de leitura de música e a dificuldade em manipular um instrumento representam duas tarefas concorrentes (na medida em que dificilmente um iniciante se conseguirá concentrar nas duas em simultâneo) e não automáticas, pois exigem muito trabalho e esforço por parte quer do aluno quer do professor (Sloboda, 1978; Priest, 1989,1993; Swanwick, 1994; McPherson e Gabrielsson, 2002; Woody, 2012).
Para além disso, todos os sistemas de notação demandam um nível de familiaridade com os valores musicais necessários para "ler nas entrelinhas" e fornecer a expressividade e outras nuances que não podem ser totalmente transmitidas pela partitura (Siu-Lan Tan, 2008). Pelo que, sem qualquer conhecimento musical, um iniciante não tem expectativas que possam ser usadas na leitura (Sloboda, 1978).
A ênfase na leitura, desde o início dos estudos musicais, no entender de McPherson e Gabrielsson, para além de poder levar a um decréscimo de sensibilidade para os padrões unificados que as crianças observam espontaneamente quando ouvem música, poderá ainda deixar poucos recursos cognitivos para devotar à manipulação do instrumento e ouvir o que estão a tocar (2002, pág. 113). Pior ainda, poderá desencorajá-las e levá-las à desistência (Rees citado em Priest, 1993). Muitos acabam por memorizar quanto antes cada nova peça, pelo que a sua performance não depende da competência em ler (Sloboda, 1985, p. 68), o que explica o facto de alguns alunos tocarem enquanto aparentemente leem notação, mas não conseguem dizer o nome das notas quando lhes é solicitado (Priest, 1989).
Priest (1989), assegura ainda que, 1) os alunos ficam restringidos a tocarem apenas o que conseguem ler; 2) a “cópia” do toque do professor tende a não ser observada; 3) o próprio professor foca-se na partitura e não no aluno, cuja posição, respiração, curvatura, ou o que quer que seja, não são observados. Acrescenta também que, os fatores essenciais da música, como as frases, a tonalidade, a afinação, atenção ao controlo muscular, consciencialização de uma audiência e o efeito de uma interpretação, poderão ser facilmente marginalizados se a leitura for a única maneira de tocar esperada. Deixa também as seguintes questões: se queremos encorajar as crianças a compor e a improvisar, então, quando devemos começar? E desde quando essas atividades se relacionam com aprender a ler desde o início?
Na realidade, até meados do século XIX estas questões não se colocavam. Nessa altura, através do método prático-empírico, os alunos iniciantes aprendiam a tocar os seus instrumentos por ouvido, imitando passagens e padrões temáticos comuns tocados pelos seus professores, isto é, aprendiam a expressar-se na música, antes da introdução da notação (Hulteberg, 2014).
No entanto, após a Revolução Francesa, assistiu-se a uma mudança radical na formação e na vida musical de um modo geral (Harnoncourt, 1990). Por um lado, a abertura do Conservatório de Paris em 1795 (que se tornou modelo para outros conservatórios europeus), levou a que a relação mestre-aprendiz fosse substituída por um sistema de ensino, no qual existe um programa pré-estabelecido e uniformizado (ibidem). Por outro, o surgimento da litografia e a possibilidade de adquirir partituras a baixo preço, levou a que a ênfase passasse a ser na música como arte reprodutiva, com a técnica e a interpretação a assumirem um papel de maior relevo (McPherson e Gabrielsson, 2002, p. 100). Desse modo, “assim que os compositores começaram a publicar os seus exercícios em manuais instrumentais, a tradição oral foi, irrevogavelmente, interrompida” (ibidem).
No sentido de redirecionar o processo de aprendizagem para a compreensão dos fenómenos sonoros, vários pedagogos defendem um modelo de ensino-aprendizagem alicerçado num processo de aprendizagem sem recurso a notação, e sem referência a aspetos teóricos, o que, no seu entender, favorecerá não só o desenvolvimento musical dos alunos, como os preparará para, futuramente, terem um elevado desempenho ao nível da leitura musical (Priest, 1989, 1993; Swanwick, 1994; Gordon, 2000; McPherson e Gabrielsson, 2002; Woody e Lehmann, 2010).
Foi com esse propósito que foram concebidas metodologias como as de Dalcroze, Willems, Carl Orff, Jos Wuytack, Kodály, Ward, Gordon, aplicadas ao ensino da música para crianças, assim como o método Suzuki ou o método Kurtág, concebidos para a aprendizagem instrumental.
A partir de meados do século XX, para além das metodologias acima citadas, podem destacar-se os trabalhos de investigação de pedagogos como Philip Priest (1993); Keith Swanwick (1994); McPherson e Gabrielsson (2002); Robert Woody e Andreas Lehmann (2010), entre outros, todos eles apoiando uma aprendizagem musical com base no som, antes da introdução de notação escrita.
Ao invés de um início musical com base na leitura, os autores citados sugerem que os alunos aprendam a “tocar de ouvido”[1] e por imitação, à imagem do que era feito antes do surgimento dos primeiros conservatórios, dando-lhes assim tempo de adquirir competências auditivas e alguma fluidez nos seus instrumentos, fatores considerados essenciais para a posterior introdução e compreensão da escrita musical.
Como afirma Swanwick “devemos favorecer fluência intuitiva antes da literacia analítica nos primeiros tempos [de estudo], primeiro a música deve ser articulada livremente antes de se decifrar a notação”, esclarecendo (de forma irónica) que “não precisamos da análise limitada de uma partitura impressa em frente dos olhos todas[2] as vezes que tocamos” (1994, p. 159).
Metodologia
A presente investigação consistiu na réplica de um estudo[3], concretizada por professores do CMAC durante o primeiro período letivo de 2018/2019. Sendo a tomada de decisões (relativamente à continuação das estratégias implementadas) um dos principais intuitos, esta investigação enquadrou-se ainda no conceito de “Pesquisa de avaliação” apresentado por Colin Robson (2002, p. 202). Para a recolha de dados, a entrevista semiestruturada revelou-se o método mais apropriado, pelo que, no final do período de experimentação, todos os participantes foram inquiridos relativamente às observações efetuadas nas aulas dos respetivos alunos. Tendo em conta os métodos usados para recolha de dados e posterior tratamento destes, este estudo insere-se ainda nos modelos qualitativos de investigação, de caráter mais descritivo e indutivo.
A primeira fase do trabalho, consistiu em debater com os professores a problemática exposta acima e dar formação àqueles que iriam desenvolver o projeto. Com o objetivo de prestar esclarecimentos efetuaram-se diversas reuniões a partir do mês de fevereiro (nas quais participaram os membros do Conselho pedagógico e os membros do Conselho científico) e, no início do mês de setembro de 2018, já com todos os professores que iriam desenvolver o projeto. Nessas reuniões discutiu-se também alguma bibliografia facultada sobre o assunto. Posteriormente, foi proporcionada uma ação de formação sob orientação de Francisco Cardoso.
O estudo consistiu na lecionação de aulas de instrumento, Formação Musical e Classe de Conjunto a todos os alunos de 1º grau (152 no total), durante o primeiro período letivo do ano letivo 2018/2019, correspondendo sensivelmente a doze aulas de Instrumento e Classe de Conjunto e a cerca de vinte e quatro aulas de Formação Musical. Essas aulas, tal como no estudo original, foram dadas de uma forma não convencional, nomeadamente sem recurso a notação.
Antes da recolha de dados foi elaborado um guião para uma entrevista semiestruturada com catorze questões, maioritariamente de cariz aberto, divididas em cinco grupos distintos, e que incidiram nas duas fases do projeto, nomeadamente na preparação para a execução do projeto, e na perspetiva dos professores após implementação daquele.
Resultados
Dos dados mais relevantes deste estudo inferiu-se que a motivação foi o aspeto positivo do projeto mais realçado pelos professores: 97,1% dos participantes relacionaram a nova abordagem com um aumento motivacional dos alunos, tendo 47% (na avaliação do projeto) mencionado esse aumento como o aspeto mais positivo do projeto.
Pesquisas como as de Varvarigou (2017)), assim como metodologias como as de Suzuki ou de Gordon (Rosário de Sousa, 1999) centradas na aprendizagem sensorial da música, apontam justamente como uma das grandes vantagens a motivação dos alunos. A literatura acerca desta temática indica-nos que, as expectativas criadas pelos alunos relativamente à concretização de uma determinada tarefa (ou seja, a sua noção de autoeficácia), poderão efetivamente afetar a sua aprendizagem (Cardoso, 2007). Como tal, através do uso de estratégias de ensino-aprendizagem mais centradas no aluno e não na leitura de notação, os professores poderão influenciar os níveis de motivação dos seus alunos.
Alguns professores referiram que a motivação dos alunos se deveu também ao facto de terem tocado repertório da sua própria escolha. Na realidade, muitos professores fizeram arranjos de peças que os alunos pediram para tocar, para que aqueles fossem capazes de as executar. Noutros casos, foi possível tocar repertório mais complexo, o que comprovou a teoria de Priest, quando diz que um aluno ao “tocar de ouvido” não fica restrito a um repertório que não conseguiria ler.
O segundo aspeto positivo mais importante que os resultados deste estudo evidenciaram foi o aumento do ritmo de aprendizagem dos alunos, mencionado por 82,8% dos docentes.
Apesar disso, seis dos professores envolvidos declararam não conseguir avaliar esse aspeto (embora noutros momentos da entrevista tenham referido melhorias nos seus alunos a vários níveis), uma vez que o foco do ensino não foi a leitura de notação. Esta questão vai de encontro ao proferido por Priest (1989), quando afirma que a influência da leitura está tão enraizada no conceito de desenvolvimento musical no ensino formal da música, que um músico sem competências de leitura é sempre visto como um músico incompleto.
A maior interação entre professor e aluno em aula, confirmada por 76,5% dos professores foi outro dos aspetos positivos resultantes da nova abordagem.
A necessidade de demonstrar mais aos alunos (processo de modelagem) – que, segundo Dickey (1992), está diretamente relacionado com o empenho do aluno, melhorando aspetos como o sentido de correção e a performance individual -, assim como a necessidade de fornecer feedback frequente, foram fatores que contribuíram para essa maior interação entre professor e aluno. Segundo Rostvall e West (citados em Marques, 2009), esse aspeto constitui uma das vantagens do ensino sensorial, na medida em que torna o ensino mais direto.
Finalmente, segundo os professores participantes, o ritmo de aula ter-se-á tornado mais rápido.
O impacto no ritmo de aula deveu-se a dois aspetos fundamentais: a uma maior dinâmica de aula, e ao facto de as aulas terem sido mais diversificadas. Embora esta tenha sido a opinião da maioria dos professores, houve quem tivesse revelado ter perdido dinâmica de aula. Segundo esses, essa perda deveu-se sobretudo ao facto de não terem encontrado estratégias que preenchessem o tempo que antes era gasto a ensinar a ler música. No entender de Priest (1989), a dificuldade dos professores em ensinar os alunos a “tocar de ouvido” deve-se ao facto de poucos conseguirem tocar dessa forma, o que no seu entender é sinal de que os métodos necessitam ser revistos.
Para além dos aspetos positivos supracitados, o facto de os professores não terem de se preocupar com o desenvolvimento de competências de leitura abriu espaço, como referenciado por muitos, para se dedicarem ao desenvolvimento de outras competências, o que levou a um maior desenvolvimento destas. Como tal, na avaliação do projeto foram referidos progressos no domínio das competências técnico/motoras (por 29,4% dos professores) e das competências auditivas (por 23,5% dos professores). Foram ainda mencionadas melhorias no domínio da sensibilidade musical (por 20, 6% dos docentes). Também na literatura podemos encontrar resultados idênticos nos trabalhos de autores como Varvarigou (2017), McPherson e Gabrielssohn (2002), Priest (1989; 1993), entre muitos outros.
Para além das competências mencionadas, os dados revelaram ainda que o novo modelo de ensino favoreceu o desenvolvimento da capacidade de memorização. No entanto, nesta investigação, os resultados mostraram também, que a memorização terá sido uma das maiores dificuldades dos alunos face à nova abordagem.
Alguns atribuíram essa dificuldade ao facto de os alunos não levarem para casa algo escrito como auxiliar de memória, o que é mais um sinal da dificuldade dos professores se desapegarem da partitura, substituindo-a por outros meios. Alguns professores ainda não assumiram as gravações como ferramenta de trabalho e uma ótima forma de substituir a partitura. Na realidade, dificilmente uma partitura poderá substituir uma boa gravação: como referiu Lars Lilliestam (citado em Varvarigou, 2017), poderá funcionar como um professor com uma paciência infinita ou parceiro para tocar em grupo.
Para a investigação levada a cabo, para além da análise de dados relativos à aprendizagem dos alunos, foi importante avaliar, como explicado anteriormente, a perspetiva e adaptação dos professores ao projeto.
Pela análise do perfil dos professores verificou-se que, sobretudo no início do projeto, muitos estavam apreensivos relativamente à adoção de estratégias sem recurso a notação.
Essa apreensão encontra paralelo na pesquisa de Varvarigou (2017) e deveu- se sobretudo à preocupação de que os alunos pudessem posteriormente vir a ter dificuldades em ler. Durante o estudo, a preocupação teve também que ver com a forma como iria ser feita a transição para a partitura, o que para alguns professores, representou uma inquietação constante. Esta questão prende-se, por um lado, com a sobrevalorização da leitura (falada acima) e, por outro, com o facto de os professores não terem explorado essas competências enquanto estudantes, e consequentemente ensinarem da forma como foram ensinados (Haddon, citado em Varvarigou, 2017).
Apesar dos receios, a maioria dos docentes procurou corresponder às expectativas da escola, preparando-se da melhor forma possível, não só nas reuniões organizadas para o efeito, mas também debatendo o assunto com colegas e efetuando pesquisas. Após o início das aulas, de um modo geral, os professores foram ficando mais confiantes.
Para tal foi determinante, por um lado, a ação de formação com Francisco Cardoso, na qual viram esclarecidas algumas das suas principais dúvidas, por outro, a perceção de muitos, de que o ritmo de aprendizagem dos alunos era mais rápido e de que a motivação destes com o novo modelo de ensino era superior à aprendizagem com partitura. No final de todo o processo, todos conseguiram ver ganhos na nova abordagem.
Por fim, foi possível perceber que ensinar sem recorrer a notação também se refletiu nos níveis de motivação de muitos professores. Por um lado, a experiência proporcionou-lhes uma nova visão do ensino, levando-os a refletir sobre as suas opções pedagógicas e a procurar melhores estratégias de ensino-aprendizagem. Por outro, a liberdade na forma como iriam conduzir o processo levou-os a ser mais criativos, quebrando a rotina que se instala muitas vezes ao longo dos anos de ensino. Para além disso, o projeto proporcionou aos professores uma maior aproximação com os pares, levando-os a partilhar ideias e estratégias e a empenharem-se de um modo diferente nas suas aulas.
Conclusões
Observando os resultados relativos à aprendizagem dos alunos e a respetiva discussão, verificou-se que todos os aspetos destacados são fundamentais num processo de ensino-aprendizagem e que todos acabam por se interligar num ciclo contínuo: 1) a interação entre professor e aluno, leva um ritmo de aula mais rápido; 2) um ritmo de aula mais rápido aumenta os níveis de motivação dos alunos; 3) os alunos motivados acabam por praticar mais; 4) a prática contínua leva ao aumento do ritmo de aprendizagem; 5) aprender mais gera maiores níveis de motivação e; 6) maiores níveis de motivação favorecem maior interação entre professor e aluno. Daqui se conclui que uma abordagem sem notação pode contribuir para um ensino mais eficaz, o que se depreendeu sobretudo do aumento dos níveis de motivação dos alunos e do ritmo de aprendizagem mais rápido.
Finalmente, os resultados da análise do perfil dos professores apontaram que, salvo raras exceções, estes se foram ajustando e vencendo os obstáculos iniciais, ao longo de todo o processo. Para muitos, ensinar sem notação acabou por ser uma experiência enriquecedora, tendo-os levado a refletir nas suas opções pedagógicas e a procurar estratégias mais eficientes para ensinar. No final do projeto, a maioria dos docentes sentiu-se, não só mais confiante, mas também disposta a investir tempo em formação.
Para as decisões que se pretenderam tomar no CMAC, os fatores acima mencionados constituíram, obviamente, indicadores decisivos. Por um lado, evidenciaram que a aprendizagem dos alunos, não só não foi comprometida, como até foi mais rápida e promotora de níveis mais elevados de motivação. Por outro, mostraram que os professores se adaptaram ao novo modelo de ensino e, com base nos resultados dos seus alunos, validaram a sua eficácia no processo de ensino-aprendizagem.
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Notas
[1] No presente trabalho, “tocar de ouvido” corresponde à definição dada por Phillip Priest: “são todas as reproduções feitas de memória assim como todas as formas de improvisação, ou seja, todas as interpretações que ocorrem sem o recurso a notação no momento em que acontecem” (1989, p. 174).
[2] Itálicos do original.
[3] A replicação do estudo não foi exata, pois foi pedido aos professores que apenas aplicassem a nova abordagem a alunos de 1o grau e não a alunos do 1o ao 5o grau, como no estudo original.